quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

ASSASSINOS

Do SOCIEDADE BLOG

Imprensa e ONU viram alvo em Gaza

As tropas israelenses entraram no "coração" da Cidade de Gaza nesta quinta-feira (15), e os ataques feriram ao menos dois jornalistas palestinos e três funcionários da ONU. Um hospital também foi atingido.
Uma explosão atingiu um bloco de edifícios que abriga as sucursais de várias organizações de mídia árabes e ocidentais, inclusive da agência Reuters.
O andar atingido abriga uma TV local. O escritório da Reuters fica um andar abaixo. O prédio abriga ainda a rede de TV americana Fox, a britânica Sky News, a luxemburguesa RTL e as árabes Al Arabiya e MBC.
Em outro bombardeio, o escritório da agência da ONU para os refugiados palestinos (UNRWA) foi atingido por três cargas de artilharia e pelo menos três funcionários ficaram feridos.
Segundo um funcionário da UNRWA, os armazéns do complexo pegaram fogo, e toneladas de ajuda humanitária foram destruídas.
Um hospital da cidade, do Crescente Vermelho (versão islâmica da Cruz Vermelha), também pegou fogo após um ataque israelense.Pelo menos quatro disparos de artilharia atingiram o prédio. Não há informações sobre vítimas.

Fonte: G1

SALVE SANTO AMARO!

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Cotidiano de Verão 2

Reforma Ortográfica por Walnize Carvalho:

ELA VOLTOU
Um retorno que virou notícia.
Ela, a esquecida. Muitas vezes chamada de ultrapassada, de interpretação dúbia: identificada como vê ora como letra u.
Sempre estive com ela e ela comigo. Identificação, amizade consolidada.
Foi em tempos idos cantada em marchinhas de carnaval: “A, E, I, O, U dabliú dabliú / Na cartilha da Juju.”
De poucos amigos, de poucas rimas e métricas, um tanto sofisticada, pois quase sempre esteve ligada a palavras de língua estrangeira: water, wats, woman, wonderful.
Comigo em total sintonia dediquei-lhe um poema: Vitoriosa, em que termino assim: (...) sou vitoriosa / quando digo: Não! / quando digo: sim! / Quando amo a mim / sou, enfim / vitoriosa / em duplicata
V V
W
WALNIZE
Falo do retorno da letra W.

Parabéns pra você.

E por falar em Walnize, o rosado solar dos Carvalho de Lemos no Farol está em festa!
Hoje é aniversário do Guilherme Lery Lemos, filho da nossa colaboradora.
Talvez, por circunstâncias alheias à minha vontade, eu fure este ano, mas deixo aqui registrado meu sincero desejo de saúde e felicidades para este querido amigo. Muitas geladas ainda nos esperam neste verão.
Bj irmão. Feliz aniversário!

Desde que o Funk é Funk é assim...

Por Leonardo Pereira Mota (M . C . Leonardo )

No último sábado, dia 10 de janeiro, o Circo Voador (casa de show do Rio de Janeiro localizada na Lapa) foi vítima de mais um ato de perseguição cultural por forças policiais e políticas de nossa cidade.

Ainda está em vigor uma lei que praticamente impossibilita a realização de bailes Funk em no Rio de Janeiro. Esta lei é de autoria do ex-Capitão da Polícia Militar, ex-Chefe da Polícia Civil de nosso estado, ex-Deputado estadual e atual encarcerado em Bangu 8, o Sr. Álvaro Lins.

Nos últimos meses tenho tentado de tudo para fazer com que esse absurdo tenha um basta. Fui, como presidente de uma associação de trabalhadores (APAFUNK), aos gabinetes de alguns deputados na ALERJ e saí de lá com a absoluta certeza de que eles aprovaram uma lei sem ter noção do que estavam aprovando. Milhares de pais de famílias estão proibidos de trabalhar dentro da lei, já que uma coisa é regulamentar e outra é impossibilitar. Existe hoje uma proposta de modificação desta lei, feita pelo Deputado Paulo Melo, e nós estamos torcendo e nos mobilizando para que seja efetivada em breve.

Tenho certeza de que o Sr. Álvaro Lins sabia o que estava fazendo, já que ele esteve em vários segmentos de nossas polícias. Como o Funk em nosso estado sempre foi tratado como caso de policia e não de cultura, os outros deputados confiaram em sua “vasta experiência” e aprovaram o absurdo. Proibir o Funk de ser tocado no Rio é como proibir a Timbalada na Bahia ou o Forró na Paraíba, o Reggae no Maranhão e por aí vai. O Funk emprega milhares de pessoas, está em todos os cantos desta cidade (tanto nos morros como fora deles), tem que ser tratado com respeito e incentivado como qualquer outra expressão cultural popular de nosso pais. Esse tipo de atitude só faz aumentar as possibilidades de extorsão e corrupção em eventos culturais que toquem Funk.


Para ler na íntegra clique aqui.

Consciência tranquila...

Garotinho voltou ontem em seu blog à carga sobre denúncias de irregularidades na contratação de shows pela Fundação Zumbi dos Palmares na gestão indicada pelo PT, no governo Mocaiber. Desta feita provocado pelo Ministério Público, republicou as denúncias e afirmou que encaminhará documentação comprovando-as ao Ilmo. Promotor Êvanes Amaro Soares Jr..
Este assunto deve causar especial constrangimento ao ex-PT local, mas não aflige a consciência deste blogueiro e de outros dirigentes e militantes destacados do partido. Quem lê este blog pode constatar em diferentes ocasiões nossas ponderações, críticas e descontentamento em sucessivos episódios - definição pela participação no governo Mocaiber, PED 2007, e composição com Arnaldo /Mocaiber. Bem acompanhado por quadros como Luciano D'Angelo, Roberto Moraes, Renato Gonçalves, Silvano, Félix Manhães entre outros, questionei sempre estas atitudes a alertamos para os perigos de tais composições.
Agora não adianta o recurso pueril a replicar Garotinho com outras acusações. Cabe ao MP, à Justiça e a polícia a apuração das denúncias e de eventuais responsabilidades de filiados do partido no episódio. Não nos cabe julgar ninguém, tampouco os companheiros que protagonizaram tais atitudes políticas. Contudo, independente do que as investigações do MP apontarem, fica configurado os equívocos seguidos da maioria da atual direção partidária em Campos. Não era preciso ser pitonisa para perceber que a tática resultaria em trapalhada. Que independente de "culpa", ao aproximar-se de um governo apodrecido - o que era sabido - se abriria o flanco para se ver envolvido em toda sorte de desvios éticos e atos de improbidade.
Apesar da consciência tranquila, impossível deixar de lamentar o caminho trilhado, em vão.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Dilma 2010!

Imagem e título enviados por e-mail pelo colaborador Gustavo Lopes, com o seguinte adendo:
Se pentear o cabelo, já é foto para material de campanha!


FOTOS: globo.com

Reações à "Cara Nova" nem tão nova assim...

A foto aí de cima é de dezembro, e foi colocada aqui no finzinho do ano. De lá pra cá tem sido muitas as "reações" à tardia atualização na imagem do blogueiro. Interessante que houve mais observações feitas pessoalmente do que em comentários aqui no bloguinho.
Podemos dizer que houve certa reprovação da nova imagem, muito embora tenha recebido também elogios - alguns até efusivos! Isso pra mim se explica em parte pelo capricho da imagem anterior - produzida pelo talento do Genilson que, com esforço, conseguiu deixar esse blogueiro menos feio - em função de projetos vinculados a origem deste blog, que não cabe mais comentar.
O fato é que a imagem asséptica e sorridente - esta última característica de fato constante em minha imagem - era agradável, "leve" e relativamente atraente. De caso pensado e produzida para tal.
A mudança da foto era uma necessidade desde agosto, quando a barba passou a compor minha imagem. Problemas operacionais do Comentários, bem definido por meu amigo José Carlos Salomão como o "primo pobre" da blogosfera campista, retardaram alteração.
Quis contudo que a imagem fosse mais do que uma simples atualização. Quis que ela trouxesse uma marca, que fosse "a minha cara" no momento que tomei tal decisão. Então ainda que crua, a imagem foi também concebida, como no caso da original. Só que neste caso, mais adequada ao gosto - e ao momento - do blogueiro do que ao senso comum dos "consumidores". Essa concepção da imagem reflete um pouco o estado de espírito que vivenciei no segundo semestre de 2008, que por sua vez também influenciou as mudanças no visual. Logo, tem um pouco a ver com desesperança, ceticismo, desânimo e decepção, algo também manifesto aqui no texto de Cazuza que permanece aí à sua direita. Acrescente a isto outros sentimentos, mais íntimos, mas igualmente sem cor e brilho. Esta era a imagem concebida que demorou cinco meses para aparecer para os leitores.
O primeiro a reagir mal ao conceito da imagem foi o fotógrafo, meu primo Ronaldo Nunes, que, mesmo sem saber o destino do instantâneo, tentou ponderar que a proposta era muito "radical". Mas a intenção era justamente essa, refletir o banzo que tomou conta de mim na segunda metade do ano passado.
Paradoxalmente, agora que essa minha faceta se apresenta para os leitores diários e eventuais, o constante sorriso franco volta a ensaiar mais vigor em suas motivações. Mas digamos que ainda estamos em transição - e nunca em transação viu Xacal? - e por hora, apesar dos protestos, fica a "cara nova" já tão nova aí até que outra imagem possa refletir melhor um outro possível estado de espírito.

Por fim, esclareço que não há - nem a luz do bom senso poderia haver - narcisismo algum neste post. É apenas uma tentativa de diálogo, motivada pelas inúmeras manifestações de amigos leitores frente a despretensiosa alteração da imagem.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Transporte público: Mudança?

Atentos blogueiros, Ricardo André e Xacal repercutem na rede a versão do Presidente da EMUT de que a passagem a R$1,00 - agendada para maio - ponto dos mais enfatizados na campanha de Rosinha para a Prefeitura "não era bem assim". A proposta, antes prática, objetiva e universal - uma tarifa modal única para os ônibus urbanos em todas as linhas atendendo a todos os usuários - agora se revela um programa social para subsidiar cidadãos de baixa renda, previamente cadastrados. Nada positiva a mudança de discurso, considerando a ênfase na proposta ao longo da campanha, ainda que a medida conforme agora se apresenta, embora confusa, tenha alcance social.

A questão da tarifa, contudo, não é o único problema a desafiar a Prefeita na questão fundamental do transporte público na cidade. O problema é tão grave que motivou a folclórica proposta do metrô de superfície por parte do então candidato Arnaldo Vianna e as recentes ações das operações Choque de ordem. A proposta de Arnaldo inclusive não tinha como problema a idéia em si. VLT's se revelaram soluções adequadas em várias cidades. O problema estava em assumir que o volume de passageiros não compensaria o investimento, e que, desta forma, o custo da ação seria necessariamente subsidiado pelo município - nada absurdo em se tratando do orçamento atual e o impacto social do investimento. Ao vender a ilusão de que a iniciativa privada se interessaria pelo empreendimento deu a Rosinha a oportunidade de um dos mais duros golpes nos debates da campanha. Pois agora é a Prefeita eleita que deve explicações sobre a "meia-verdade" propagandeada na campanha.

Mas voltando ao assunto, além do "transporte alternativo" - que se sustenta na ineficiência do setor formal - há muito mais a ser enfrentado no setor. Um problema grave é a frota. Em horários de pico, os que resistem a utilizar as kombis ou dependem do RIO Card sofrem com o desconforto dos microônibus, que proliferaram por duas razões: diminuem drasticamente o espaço destinado à gratuidade social (estudantes e idosos) e eliminam gastos com pessoal ao dispensar a figura do cobrador. Os micro podem ser uma boa opção para algumas linhas, especialmente circulares, ou em alguns horários. Mas em horários de grande fluxo de passageiros ele gera um desconforto e uma superlotação que parece uma condenação a quem opta pela legalidade! É preciso incentivar e até financiar a renovação das frotas como contrapartida a exigências de eficiência que incluam horário, segurança e conforto para o usuário. Só assim este deixará de recorrer ao "alternativo".

Há ainda outros problemas graves: a irracionalidade das linhas, a ausência de funcionalidade na utilização das duas rodoviárias, entre outras questões. Voltaremos ao assunto.

Cotidiano de Verão

GLOSSÁRIO
Largar o moreno: Discreta, logo útil, expressão cearense registrada em momento de alegre convivência e bebericação com grupo querido e animado, integrado por um simpático filho daquela terra, grata amizade conquistada em 2008.

Marcas das cheias

Retornei à campos há algumas horas pela BR-356, liberada ao tráfego neste fim de semana. Passei por Cardoso, onde as marcas da imundação na fachada de várias casas revela a dimensão dos prejuízos e transtornos sofridos pela população local. Em alguns trechos da rodovia as margens da pista e até pequenos trechos dela permanecem alagados. Veículos leves podem ter problemas na aventura de trafegar pela estrada.
Permanece dramática contudo a situação da população de Três Vendas. Por lá muitas casas permanecem debaixo d'agua e pude ver duas ou três canoas circulando pelas ruas ainda imundadas. (Este blog - classificado pelo meu amigo José Carlos Salomão como o "primo pobre" da blogosfera local - precisa mesmo providenciar uma máquina fotográfica para seu "patrimônio". Daria uma boa - e triste - imagem a ilustrar esse post o registro do tráfego de barcos pelas ruas da localidade atingida pelas cheias.)

domingo, 11 de janeiro de 2009

+ Poesia no bloguinho...

TABACARIA

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.

Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.

(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)

Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.

(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)

Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente

Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.

Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.

Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,

Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.

Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.

Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.

Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.

(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.


Álvaro de Campos, 15-1-1928