segunda-feira, 5 de outubro de 2009

O brasileiro e seu duplo

Nesse último domingo (04/10/09) o jornal Folha de S. Paulo dedicou um caderno Mais inteiro para divulgar e debater uma intrigante pesquisa de opinião nacional (Datafolha realizada entre 4 e 6 de agosto). Dois padrões opinativos surpreendentes são destados da análise dos dados brutos: a homogeneização de opinião dos brasileiros (independentemente de renda, escolaridade, religião, sexo, etc) e a desconfiança pública e generalizada com relação ao "outro" (compatibilizado com o elevado padrão moral da auto-avaliação dos indivíduos)! Ou seja, corrupção é um assunto do "outro", uma espécie de duplo criado pelo sado-masoquismo nacional e que emerge naquelas frases do senso comum que iniciam por "O brasileiro é assim ... ". Para a maioria da população entrevistada o ordenamento de suas respostas sobre o fenômeno da corrupção tem como resultado: trata-se de algo que ocorre no setor público, no governo (43%), é identificado como falta de ética (21%), com roubo de dinheiro (19%), etc. O emérito professor-pesquisador Wanderley G. dos Santos argumenta: "O principal objeto de interpretação consiste na variação de frequência nas respostas dentro de cada e entre as variáveis (sexo, renda, escolaridade etc.). (...) Mas precisamente aí é que sobressai a convergência normalizadora, antes da divergência derivada da autonomia individual." Na questão da assimetria entre a auto-percepção ética e condenação moral do "outro" na vida pública (discutidos pelo pensador Renato Lessa), nos posicionamos como um monstro filosófico: na consciência pessoal somos kantianos rigoristas morais, na consciência pública somos hobbesianos (no estado natural de nossa vida pública, eles, os brasileiros, são "lobos" que se devoram). W. G. dos Santos finaliza sua reflexão com um questionamento: "Duas questões decorrem da interpretação que ofereci. 1ª: quais são os grandes normalizadores da sociedade democrática brasileira contemporânea? (...) 2ª: em uma democracia, quais são as consequências políticas de uma sociedade sociologicamente normalizada? Tribuna livre."

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