quinta-feira, 30 de julho de 2009

A África e a crise

A atual crise das economias capitalistas divide a opinião de analistas em todos os seus aspectos e o debate sobre suas origens, abrangência, profundidade e soluções está aberto produzindo consensos bastante frágeis. Mas pelo menos em um tema as opiniões convergem: a crise deverá piorar muito a situação das nações mais pobres, estimativas divulgadas pela ONU no início deste mês revelam que estarão na extrema pobreza 90 milhões de pessoas a mais do que o previsto antes da crise. Segundo a FAO, como reflexo da recessão mundial o número de pessoas subnutridas deve passar a barreira de um bilhão em 2009.
Entre as nações pobres a situação dos 42 países que se situam abaixo do deserto Saara é muito preocupante, estimativas da ONU divulgadas em março revelam que a crise deve reduzir em U$S 46 a renda dos indivíduos que vivem em extrema pobreza. São países onde mais de dois terços da população vivem em áreas rurais e dependem da agricultura como fonte de renda e subsistência. O setor representa 17% do PIB destas nações e é responsável por mais de 57% do emprego. Mas os limites da produção agrícola são gigantescos: apenas 4% das reservas de água disponíveis são utilizadas para irrigação, além disso, apenas 14% das terras agricultáveis são cultivadas e o uso de fertilizantes é muito precário, enquanto na Ásia são usados 153 quilos de fertilizantes por hectare de terras, na África Subsaariana são utilizados apenas nove.
Por mais paradoxal que possa parecer entre as pessoas mais pobres do mundo estão os pequenos produtores de alimentos, são famílias que cultivam até um hectare de terra e não possuem condições de comprar sementes de alto rendimento, fertilizantes ou equipamentos de irrigação. O resultado é uma produtividade muito baixa e insuficiente para sua subsistência. “A pobreza é causa de baixa produtividade agrícola, e a baixa produtividade agrícola realimenta sua pobreza. É um círculo vicioso”. O economista americano Jeffrey Sachs chamou este círculo de “Armadilha da pobreza.”
A força tarefa contra a fome, do projeto milênio da ONU estudou o problema e recomendou uma ajuda a pequenos agricultores africanos como forma mais eficiente de combater a fome no continente. Foi com base nestes estudos que em 2004 o secretário geral da ONU, Kofi Annam lançou o apelo pela “Revolução verde africana” como forma de acabar com a fome e subnutrição apostando principalmente no desenvolvimento agrícola. A idéia não é nova, já em 1962 o agrônomo francês René Dumont lançava o livro “A África começa mal” ressaltando a importância da agricultura e da integração das populações rurais. Segundo Dumont o subdesenvolvimento da agricultura afeta seriamente toda a economia e “não pode ser separada da falta de indústria e do subdesenvolvimento em geral, o progresso agrícola é indispensável."
A recente reunião do G-8 ocorrida em L’aquila na Itália anunciou uma ajuda de U$S 20 bilhões para pequenos agricultores, a iniciativa está sendo comemorada como um potencial avanço histórico no sentido de combater a fome e a extrema pobreza. Os investimentos podem significar um aumento da produção de alimentos e a interrupção da armadilha da pobreza em muitas regiões. Programas de ajuda internacional produziram efeitos muito diversos no mundo, enquanto o paradigmático Plano Marshall pode ser visto como um caso de sucesso na Europa ocidental, o mesmo valendo para programas nos países do leste asiático, há exemplos de iniciativas muito mal sucedidas. Segundo J. Paul Martin, diretor executivo do Centro de Estudos de Direitos Humanos da Universidade de Columbia um dos principais problemas que afetam negativamente os resultados da ajuda externa nos países em desenvolvimento é a “falta de preparo por parte dos países beneficiados com relação a níveis endógenos de educação.”
Por isso deve ser motivo de celebração a iniciativa do IFF-Campos em desenvolver o Projeto Angola/Brasil. O convênio prevê capacitação de professores e técnicos angolanos, além de orientar a construção, administração e instalação de cinco centros de formação profissional no país africano. Saber que professores da cidade estão cruzando o atlântico para levar conhecimento e experiência educacional a um país como Angola deve ser motivo de orgulho para toda a cidade. Uma prova de que podemos e devemos pensar grande, ousar. Ajudar os angolanos a desenvolver seu sistema educacional é uma evidência de nossa maturidade e de nossas potencialidades além de corroborar com o adágio de Julius Nyerere, líder da independência e primeiro presidente da Tanzânia, "As pessoas não podem ser desenvolvidas; podem apenas se desenvolver."

Artigo publicado no Monitor Campista quarta feira 29 de julho.

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