quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Sobre o preço mínimo da cana

O inquieto Xacal citou há alguns dias este blog ao propor um debate sobre a política de preço mínimo da cana, desenvolvida pelo Ministério da agricultura para produtores do nordeste e estendida recentemente aos plantadores de cana da região por iniciativa do deputado Chico D'Angelo (PT-RJ). Por razões de ordem particular não pude de imediato contribuir com o debate que recebeu algumas colaborações via coments no post d'A TroLha. Resolvi então, a bem do diálogo construtivo e esclarecedor, transcrever aqui minha intervenção naquele blog em resposta à provocação do blogueiro e aos comentários lá suscitados:

Há dez anos atrás, quando assessorei o Professor Luciano D'Angelo na Secretaria Municipal de Agricultura, participei da gestão que tentou efetivamente promover a diversificação agrícola entre os pequenos produtores de Campos, com o apoio da EMATER e da Pesagro. Leite, piscicultura, fruticultura, beneficiamento da própria cana (aguardente), foram alternativas fomentadas pelo então secretário junto aos pequenos e médios produtores rurais, que já àquela época representeavam a maioria dos proprietários rurais do município, no sentido de agregar valor à produção e promover a pequena agroindústria familiar.
Hoje, uma década depois, e apesar da desvalorização da cana, é inegável o apelo que tal cultura continua a ter junto aos produtores locais. Para quem não sabe, até mesmo assentados da Reforma Agrária produzem cana como uma das poucas alternativas de comercialização da produção, apesar do preço aviltado.
Assim, é um equívoco associar a medida aqui em debate aos interesses de usineiros e grupos empresariais que aqui se instalaram para explorar usinas locais. Isso se daria, se for o caso, de forma indireta.
O perfil dos associados da Asflucan hoje é diferente do que tal entidade já representou no passado e que ainda preenche o imaginário de militantes de esquerda.
É fato que a associação hoje reúne um conjunto de pequenos e médios fazendeiros empobrecidos e que muitas vezes não conseguem extrair da cultura lucro algum, além do que cobre os custos da produção. A medida aqui em debate não favorece latifundiários, e gera empregos. Não ignoro que empresas de fora que exploram usinas locais tem sido pródigas em burlar a Lei e explorar trabalho escravo, o que tem o meu mais veemente repúdio. Mas isso nada tem a ver com os dados do CAGED que atestam que a presença de trabalhadores locais em situação regular na lavoura de cana tem aumentado sistematicamente sua representatividade no emprego formal na cidade, fruto da ação fiscalizadora do Ministério do Trabalho no governo LULA.
Assim, pelos argumentos expostos, insisto que a medida é completamente distinta dos subsídios de outrora, citados pel'a hiena, contemplando uma base social que hoje é distinta dos usineiros e latifundiários questionados com razão pelos comentaristas supra.

11 comentários:

xacal disse...

distinto em quê, nobre Fábio, se as estruturas sobre as quais estão erigidas as atividades permanecem intactas...

repito: intactas...não importa o tamanho das unidades...

subsidiar uma atividade que se baseia em trabalho degradante e poluição ambiental é um contra-senso absoluto...

do jeito que você fala, dependendo do tamanho e da capacidade econômica dos contemplados, é permitido o abuso na relação capital-trabalho...

aponte aí onde a cultura da cana evoluiu nessa terra, quais são os novos indicadores e os avanços nos impactos sócio-ambientais...

é isso, meu caro...

o chicote no eito é tão cruel se empunhado por um coronel ou por um sitiante...

os recursos estatais deveriam estar a serviço da recolocação dessa massa semi-escravizada em outra atividade, enquanto outras formas e insumos fosse introduzidos nesse sistema produtivo...

defender o mandato é uma coisa...mais aí o companheiro está exagerando...

pergunto: você já esteve em alguma turma de corte de cana...??? visite uma, quer seja em uma grande fazenda ou em um pequeno sítio...

diga-me qual a diferença...

FÁBIO SIQUEIRA disse...

Conforme pretendo desenvolver em diálogo com o Vitor Peixoto em "Outros campos", em minha perspectiva não está uma política de Estado capaz de reestruturar profundamente a produção agrícola local.
Ainda se fosse esse o caso, sem reparo às necessidades de introduzir regulamentação ambiental à cultura e de mecanizar a colheita, creio que a cana se manteria no cenário econômico local.
No contexto presente, o que se fez foi apenas atender a demanda de pequenos produtores locais - que de fato operam com produtividade abaixo do ideal - no que se refere a uma política de governo pré-existente e que beneficiava exclusivamente produtores do nordeste. Uma ação pontual, imediata e que não retira da pauta as outras questões pertinentes colocadas por Xacal e Vitor Peixoto.
Insisto que não há como colocar num mesmo patamar usineiros e latifundiários de outrora e pequenos proprietários empobrecidos ou assentados.
Quanto á provocação sobre o desumano trabalho na lavoura canavieira, vc bem sabe que conheço e sou sensível à questão. Como também sabe que muitos dos explorados temem trocar tal sina pela "alternativa" do desemprego e da miséria total. Realmente seria o caso de criar alternativas de recolocação destes trabalhadores em outras atividades, e, talvez, de se pensar em mais subsídios para fomentar a mecanização do corte, resolvendo a questão das queimadas e do trabalho degradante sem inviabilizar a atividade dos pequenos produtores locais.

a hiena disse...

É a velha mania do público colocar o seu talo na privada. No auge do ciclo canavieiro (21 usinas) ele fez vista grossa no acompanhamento das verbas irrigadas através dos institutos, como o IAA e outros, permitindo que maior parte desses investimentos não tomassem o caminho da roça e sim o conforto da cidade. Depois ele não cuidou para evitar o êxodo rural (mano Xacal, você está correto. Peça ao Fábio para dar um pulo, um dia desses e conhecer um canavial - lá ele vai ver muitas casas abandonadas no meio da cana. A maior parte dos trabalhadores hoje envolvidos no corte da cana moram nas periferias da cidade), onde os "colonos" permaneciam nas terras, com moradia e a permissão de lavouras de subsistência,e criação de pequenos animais, mesmo que fossem no sistema de meeiros. Naquela época, o trabalho não era tão degradante, tendo em vista as parcerias que eram feitas com os proprietários. Esses subsídios, a quem estão beneficiando. Dêem uma olhada nos controles de entrada de cana nas Usinas e vejam quem mais está colocando cana. Lá vocês vão encontrar muitos mini-barões, alguns deles próximos ao nobre deputado que se diz pai dessa criança doce. Porque o nobre deputado não empunha a sua catana e briga pelo fim das queimadas nos canaviais e pela utilização moral de recursos os órgãos de fomento e investimento, a exemplo dos FUNDECANS, FUNDECANA e outros que tais, que poderia oferecer alternativa de empregos qualificados na pedra. Lá no interior, a exemplo de São Paulo, deixe as máquinas fazerem os serviços. E, ainda, quanto ao preço da cana e por seguinte do álcool e do açúcar, deixo o mercado regular essas relações. Mania que esses barõezinhos tem de ao primeiro aperto, correr para os cofres da viuva pátria mãe. Se não tem competência para mexer com a glicose, arruma outro trabalho para fazer.

xacal disse...

o problema que essa "alternativa", essa "perspectiva" foi deixada de lado, mais uma vez, e aí: fodam-se os trabalhadores, e o que é pior: com o dinheiro dos impostos deles mesmos...

xacal disse...

aqui está o cerne da questão, que você coloca como secundário...o dinheiro público deve trazer bem estar a todos da escala produtiva, e, principalmente, aos hipossuficientes...

o cálculo do deputado, seu e dos "pequenos produtores" excluiu esse raciocínio...

reproduziu a lógica dos grandes usineiros e dos latifundiários...só que com o argumento que era para atender os pequenos...

eu sei, eu sei...é um problema "de classe", de "origem"...

um abraço...

xacal disse...

ahhh, embora reconheça que a opçãom pelo local do debate seja sua, muito me entristece que suas respostas não tenham sido enviadas para lá, no post da TROlha, ou por e-mail, como fez o vitor...

mas eu entendo...defender o chico em um espaço com mais audiência é complicado...rsrsrs

FÁBIO SIQUEIRA disse...

Aqui sempre haverá espaço para o debate e a livre expressão de opinião.
E também resposta às provocações.
Como já disse, conheço a realidade do trabalho degradante na lavoura da cana, "in locus" e através de registros em estudos acadêmicos, militantes ou audiovisuais, como no documentário "quadra fechada". E sou profundamente solidário à estes trabalhadores. Só que isso não me leva a, tal qual um avestruz, enterrar a cabeça na justa denúncia desse quadro e ignorar a realidade ampla e complexa que inclui outros segmentos sociais, inclusive os "inimigos de classe".

Quanto ao debate, ele está colocado aqui, n'A TroLha e em "Outros campos". Comentei o post da TroLha lá e publiquei aqui o texto. Aqui, respondi respeitosa e democraticamente o que foi comentado aqui. Assim que tiver o tempo que o diálogo exige, vou responder ao Caro Vitor Peixoto em seu blog, e terei toda a tranquilidade para apresentar meus limitados mas sinceros argumenmtos n'A TroLha, como de costume, sempre que julgar oportuno.

xacal disse...

o problema, já que tocou no assunto, é não enterrar a cabeça como avestruz, concordo...

mas o que me dizes do avestruz que a tudo engole, inclusive subsídios para um setor que "mói" gente para fazer açúcar...???

o que o companheiro quer fazer, a título de privilegiar sua posição no debate, é segmentar a cultura de cana, como se fosse possível isolar a demanda do pequeno proprietário, sem levar em conta de que ele polui e sacrifica a mão-de-obra como o grande...

se o fato de ter pouco faturamento justifica tal medida, por que não pedir aos comerciários das mercearias para trabalharem 24 horas por dia, sem folga semanal, enquanto o BNDES financia seus patrões, os micro e pequenos comerciantes...???

não é uma boa idéia...??

Anônimo disse...

Qualé a desse Xacal? já não basta ele ter a "privada" dele (a trolha)vem defecar no blog dos outros!

FÁBIO SIQUEIRA disse...

Eis aqui o problema do binômio democracia/responsabilidade que impõe a necessidade da moderação e do bom senso no manejo desta nesta REDE BLOG!
Caro anônimo(a) das 09:18, agradeço alguma solidariedade que possa estar implícita no comentário, mas o Xacal é um debatedor de rara inteligência, e é bem-vindo aqui. E, para mim, não há o inconveniente do pseudônimo pois identifico bem o meu interlocutor de anos...
As vezes, como agora, discordamos e ele consegue até algo relativamente difícil: me irritar. Mas há entre nós laços que não cabe aqui explanar, mas que determinam sempre limites de respeito e tolerância em nosso convívio. A consideração e a amizade que tenho por ele sempre refream minhas reações mais dignas da sua fúria. Mesmo quando ele não gosta do "Avestruz", rs,rs,rs...
Enfim, acho que já falei demais de coisas particulares, mas era pra marcar que:
1- Este é um espaço de diálogo e de TOLERÂNCIA - e não só com os amigos de longa data;
2- Isso não nos redime da difícil e cotidiana tarefa de medir sempre com cuidado a conveniência de moderar certos comentários. Para além dos critérios deste blog - já explícitos reiteradas vezes - tempos que dosar sempre a pertinência e a coerência da contribuição ao debate, mesmo quando nos contraria; a necessidade de garantir a liberdade de opinião e expressão; tudo isso sem que o espírito democrático do blog o leve a alguma injustiça ou transgressão legal. Assim sendo, as vezes podemos falhar, apesar da busca constante pelo bom senso e pelo critério.
Viva ao debate na REDE BLOG! Viva à liberdade de expressão! Viva ao bom senso! E que ele não nos abandone!
Bom dia.

VP disse...

Caro Fábio,

Li seus comentários lá no Outros Campos, assim como os do amigo Xacal.
Não teria nada a acrescentar ao que já escrevi. Somente uma questão que diferencia as nossas proposições e talvez não tivesse ficado muito claro para todos, a saber, em momento algum fiz avaliações diretas do mandado do Deputado Chico D'Angelo. Estava a avaliar a política pública em si. Se esta representa, ou não, uma questão pontual nas atividades do Deputado, cabe ao partido explicar aos seus eleitores.
No mais, o que tenho é agradecer ao Xacal e a você a oportunidade leal e honesta do choque de idéias. Como no adágio popular, uma pedra precisa de outra para que do seu embate venha a fagulha.


Grande abraço,


Vitor Peixoto