domingo, 29 de março de 2009

Crônica

A SOLITÁRIA ARTE DE SE COMUNICAR

Walnize Carvalho

Tarde de domingo.
Trancada em meu quarto leio atentamente no jornal a matéria sobre uma pesquisa que enfoca a vasta e inédita correspondência entre o sociólogo Gilberto Freyre e o escritor José Lins do Rego. Já em outra página chama-me a atenção a publicação de um livro em que estão reunidas cartas do grande escritor brasileiro Machado de Assis quando... Toc!Toc! Toc! As batidas na porta interrompem minha leitura.
A neta, que acabara de chegar, comunica que irá usar o computador. Tento segurá-la um pouco e puxando conversa pergunto-lhe: - Não vai ao cinema, nem ao shopping? E ela: - Vou no MSN! E eu, demonstrando conhecimento: - Vai bater papo com as amigas? – Sim, vó! – responde-me. E eu, demonstrando interesse no mundo virtual, recebo dela uma enxurrada de informações: MSN, Orkut, Skype, WebCam – as mais variadas formas de comunicação.
A adolescente sai deixando a porta entreaberta o que dá para que eu ouça o Plim do seu celular e, em seguida... Tec! Tec! Tec! Sinalizando que acabara de receber um torpedo e está retribuindo.
E retornando à internet leva um bom tempo (talvez hora e meia) conectando “seus amigos em comum e comunidades”.
E não sei se é por causa das matérias sobre correspondências, ou se é pelo Outono (tida como estação melancólica) sou invadida pelos meus “ismos”: saudosismo e romantismo (e olha que já nutro até certa simpatia e amizade pelo meu computador).
Mas... lembro-me do hábito salutar de escrever e responder cartas. A ida aos Correios. Selo. Cola. E depois... A espera do carteiro. O abrir apressado do envelope e o reconhecimento da autoria através da letra desenhada.
Recordo-me do relato dos mais saudosistas sobre cartas em papel cor de rosa ou em folhas de seda. Muitas com leve fragrância de perfume, algumas com pétalas de rosa e até as que traziam marcas indeléveis de batom (vermelho carmim) impregnadas de paixão. Todo um ritual de comunhão e sutileza.
Anoitece.
Pela fresta da porta a luz azulada da tela do computador reflete o rosto da menina.
Eu – a meu canto – encerro o domingo assistindo em DVD “O Carteiro e o Poeta”.


Crônica publicada na edição de 29/03 do Monitor Campista.

3 comentários:

Danielle Manhães disse...

Oi Fabinho, adoreeeeei a crônica “A SOLITÁRIA ARTE DE SE COMUNICAR”.

Lembrei-me de vários episódios da minha meninice, longe da atual realidade dos PCs.

Eis uma delas:
Na minha infância/adolescência, (lá pelos anos 80/90) a “onda do momento” era trocar papéis de cartas. Comprava os papéis de cartas com a pequena mesada que recebia e trocava na escola com as colegas. Era uma febre entre as meninas. Os melhores papéis eram aqueles mais coloridos e menos amassados - naturalmente. Hoje em dia, falo com minhas primas de 16, 17 anos, elas riem na minha cara e ainda tenho que engolir um: “Que graça tem nisso?”

Mas pelo menos, pra ocorrer essa troca de papéis era preciso um contato pessoal. Lembro-me que fazíamos uma rodinha no pátio da escola e cada uma passava suas pastas para a outra. Nem percebíamos o passar das horas...
Tenho essa pasta até hoje, acredita?
Que época boa, que não volta mais...
Ai meu Deus! Acho que to ficando velha... Ou como diz a Walnize Carvalho, devo ter sida invadida pelos “ismos” também. Rsrsrsr...

É claro que a internet e todos os seus recursos contemporâneos são indispensáveis nos dias de hoje. Utilizo todas as ferramentas possíveis que são oferecidas pela rede.
Mas não tem nada mais atemporal do que aquele velho e bom bate papo olho no olho. Não é mesmo?


Bjs!

=)

xacal disse...

Eu me lembro das meninas com seus papéis de carta, no que chamávamos de "recreio", e hoje virou um nome frio: intervalo...

É Danni, nem sei se envelhecemos, ou se as coisas ficam cada vez mais "novas" a cada dia...

Um abraço...

walnize carvalho disse...

Amigo Fábio,
Obrigada mais uma vez pelo carinho em postar minha crônica.
Walnize