segunda-feira, 1 de junho de 2009

ESCOLHAS RACIONAIS

Num mundo como nosso, todas as crenças podem passar pelo crivo da razão. Ora, uma das crenças básicas da vida moderna é justamente aquela que afirma a racionalidade do nosso comportamento em sociedade. Portanto, indivíduos e grupos seriam atores sociais auto-conscientes: dotados de racionalidade suficiente para reconhecer seus reais interesses e os melhor defender. Na edição de ontem (31/05/09) da Folha de São Paulo, encontramos duas discussões que nos fazem questionar a pressuposta racionalidade de nosso mundo. Numa interessante entrevista, o professor de psicologia da Universidade de Princeton e Prêmio Nobel de Economia (2002), Daniel Kahneman debate a irracionalidade dos agentes econômicos e seu papel na atual crise mundial:
Folha: Como a psicologia econômica explica a atual crise financeira? "Havia uma crença forte de que os mercados iriam organizar os preços das ações, hipotecas e moedas de maneira eficiente, o que não foi o caso. (...) O fato é que os agentes financeiros estão mais preocupados em aumentar seus próprios ganhos e não conseguem ver os riscos que estão tomando. (...) Tomar esse tipo de risco (hipotecas 'subprime') era irracional.
O que é mais complicado e ainda mais interessante saber é por que os presidentes dos randes bancos e as autoridades dos governos não conseguiram ver tudo is chegando?"
Folha: E por que? "Porque aquilo que não conseguimos imaginar simplesmente não existe para nós. (...) as pessoas trabalham com estatísticas erradas sobre o mundo e ignoram o risco de eventos aleatórios e imprevisíveis, mas que acabam dominando o mundo. (...) O mundo é um lugar instável, em que as coisas são complicadas. É aterrorizante a ideia de que não compreendemos o mundo que nos cerca. E não comprendemos bem o que aconteceu em 2008."
Folha: Teremos um período de regulação forte (da economia) pela frente? "Precisamos fazer algo porque alguma coisa terrivelmente errada aconteceu. A regulação tem de evitar que o comportamento dos indivíduos cause novamente uma crise sistêmica e provoque perdas de bilhões."
No seu artigo dominical, o célebre jornalista Gilberto Dimenstein nos pergunta: "Você seria professor de escola pública?" A argumentação dele gira em torno da questão dos estímulos sociais necessários para escolha (racional) do magistério. Recentemente, os institutos Ibope e Datafolha pesquisaram os jovens brasileiros sobre suas expectativas profissionais. Resultado: não basta ter emprego. "É preciso ser reconhecido e valorizado profissionalmente, com possibilidades de reciclagem. Como fazer esse pessoal se sentir tentado a sonhar em dar aulas na rede pública?
Não consigo ver um problema tão difícil (e tão relevante) para ser resolvido: estamos metidos num círculo vicioso. As nações que mais evoluíram socialmente são aquelas que melhor souberam atrair talentos para disseminar conhecimento. (...) Na semana passada o governo federal lançou um bilionário programa para estimular a formação de professores _ não apenas o sucesso do plano, mas o futuro do país está atrelado à capacidade de atrair os talentos para as escolas públicas."
Os desestímulos são brutais: além do massacre diário da vida do professor de escola pública, o dado relevante é que dentre os que têm diploma, o professor é o que tem a pior remuneração. A irracionalidade desse ciclo vicioso chega a ser alucinante. É numa situação como essa que podemos perceber o grau de perversidade dos governos estaduais (dentre eles o de SP) que fazem oposição ao piso nacional do professor, defendido pelo governo Lula!
Nas palavras de Dimenstein: "O desafio brasileiro é saber quando (e se) dar aula na escola pública fará parte dos sonhos _ se não fizer, também não se poderá sonhar com um outro país."

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