sábado, 3 de outubro de 2009

Madison acorda, eles enlouqueceram

O dia doze deste mês foi marcado por uma manifestação em Washington nos EUA que recebeu injustificada negligencia dos meios de comunicação no Brasil e em outros países. Os organizadores falam em um milhão de pessoas e diferentes órgãos da imprensa calcularam entre trinta e setenta mil o número de manifestantes. Estamos falando da “Taxpayer March” ou marcha do contribuinte, com amplo apoio da rede Fox de televisão a mobilização foi convocada por uma organização chamada Freedomworks que defende redução de impostos e não intervenção do estado na economia. O objetivo era protestar contra o aumento de impostos e contra as ações do governo Obama no sentido de expandir o sistema de saúde pública no país.

Aparentemente tudo corriqueiro: um país democrático, uma manifestação pacífica, um protesto contra aumento de impostos. Nada mais americano que isso, afinal o país foi fundado a partir de um movimento inicialmente motivado por questões de natureza tributária. No entanto um olhar mais atento aos manifestantes revela imagens incríveis, assustadoras. Refiro-me aos cartazes caseiros que vários americanos portavam com indisfarçável orgulho, as frases e montagens fotográficas são tão surreais que parecem ficção. Um garoto de uns treze anos trajava uma camiseta preta onde se lia: “a cura para o comunismo de Obama é uma nova era de Macarthismo”; uma senhora idosa carregava um cartaz intitulado “a matemática americana”. Nele é possível ver as fotos de Lênin, Stálin, Hitler e Fidel Castro cuja soma é igual à Obama. Mais a frente outra senhora empunha os seguintes dizeres: “O anticristo está vivendo na casa branca”. As imagens exibem com cores fortes o pensamento da extrema direita americana, um cartaz parece resumir o desejo de todos: “Enterraremos Obama como fizermos com Kennedy”.

O pensamento conservador nos EUA tem raízes na colonização, o país sempre teve vários grupos de extrema direita sendo alguns organizados em partidos. Há uma variedade impressionante de programas partidários que parecem ter saído de algum anedotário. Nacionalismo, fundamentalismo cristão, Homofobia, defensores da supremacia branca, unilateralismo na política externa, antisemitismo, e defesa radical de princípios liberais na economia são alguns dos ingredientes destas associações. A eleição de Obama e as propostas de reformas sociais parecem ter dado fôlego, bandeira e coragem para eles saírem às ruas e anunciarem publicamente suas idéias.

O radialista e cineastra Alex Jones filmou “A decepção Obama” onde acusa o presidente de ser um agente a serviço de financistas que também teriam patrocinado Lênin, Stalin e Hitler. James Von Brunn ex-combatente da segunda guerra é nazista assumido, escreveu livro louvando Hitler e negando o holocausto, é autor de vários atentados e de pelo menos um assassinato. Sua acusação: Obama é um representante disfarçado de uma conspiração judaica. Pela matriz religiosa os ataques procuram apresentar o presidente americano como um ateu pró aborto e que pretende promover o islamismo. Jornais já chegaram até a questionar a nacionalidade do presidente afirmando que teria nascido no Quênia e não no Havaí. Delírios histéricos como estes expressam a voz de uma minoria branca ressentida que como vemos não conseguem enxergar nada além de seus preconceitos, a boa notícia é que eles não têm voto. Mas a postura dos republicanos é preocupante, desmoralizados com o fracasso retumbante de Bush filho e com a crise que ele pilotou, flertam com esses grupos, alimentam suas insanidades. Sarah Palin ex-candidata à vice pelo partido escreveu que a reforma de saúde proposta por Obama vai promover a eutanásia dos improdutivos e instaurar o “tribunal da morte.”

A quase cento e oitenta anos atrás o francês Aléxis de Tocqueville escreveu um livro genial sobre os EUA que ele visitou, e no penúltimo capítulo alertava: “a espécie de opressão com que os povos democráticos são ameaçados não se parecerá em nada com a que precedeu no mundo ... despotismo e tirania não convém. A coisa é nova, é preciso procurar defini-la.”

artigo publicado no Monitor Campista, 30 de setembro

3 comentários:

ruivo disse...

isso é nojento da vontade do vomitar.

obama é outra porcaria capitalista nesse mundo tambem, nao sei como esses extremistas o enxergam como comunista.

Gustavo Carvalho disse...

Meu caro Renatinho, a "coisa" em questão parece se relacionar com um outro traço característico da democracia na América elucidado por Tocqueville: a MEDIANIA do horizonte de expectativas e do quadro de opções do homem comum! Ao contrário da "liberdade positiva" motivadora da cidadania revolucionária francesa (inspirada no Iluminismo e no universalismo dos direitos do homem e do cidadão), a "liberdade negativa" (a liberdade do homem civil em oposição permanente ao ativismo do Estado-Leviatã) produz o confinamento do homem aos seus INTERESSES como agente econômico de existência meramente privada. Some-se a isso o comunitarismo proviciano e o fundamentalismo cristão de direita, teremos a substância cultural responsável por aberrações ideológicas como essas!
Saravá misifio

Maycon Bezerra disse...

Excelente texto, é importante que sejamos capazes de refletir a respeito do movimento das "placas tectônicas" da sociedade estadunidense. Muita coisa pode acontecer, para o bem e para o mal. Grande abraço!