quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Romance é ótimo!

Depois de Shreck Terceiro - interrompido pela metade pelo ímpeto da pequena Fabiana, fã do Ogro (possível associação com a figura paterna?) - retornei ontem, após longo e involuntário interregno ao Cine do Shopping 28. Fico triste em ficar tantos meses sem prestigiar nossas salas dedicadas à exploração comercial da sétima arte, sentimento que se intensifica com o panorama da pequena sala quase vazia para a única sessão diária de um excelente filme. Dá uma culpa antecipada por eventual retorno dos tristes períodos em que ficamos sem sala de projeções na terrinha. Espero sinceramente que os campeões de bilheteria que atraem namorados nos fins-de-semana e os filmes e animações infantis da temporada de férias que se inicia garantam a saúde financeira do empreendimento!
Mas estou aqui para falar do filme. Ótimas performances de monstros como Wagner Moura, La Sabatella, José Wilker, Andréa Beltrão, Britcha e Nanini, apesar de curta participação. Roteiro certeiro no recurso a imortal história de Tristão e Isolda. E, num parecer de grande expertise "perfeita combinação de linguagens estéticas do Teatro, Cinema, Teledramaturgia e artes plásticas", ou algo nesse sentido. Estória envolvente e a marca de qualidade do craque Guel Arraes. Ganhei a noite. Vale conferir!
Agradecimento especial à Adriana - e ao acaso - responsáveis pela ótima dica e pela agradável companhia.

P.S.: Em tempo, enquanto escrevia o texto me lembrei que a última vez que tinha ido ao Cinemagic - então Cine Ritz - foi para ver Tropa de Elite. A confusão deve ser por conta da minha memória seletiva em função de episódios que envolveram a ocasião e que não cabe aqui comentar. Ah, agora também estou em dúvida se Scoop foi antes ou depois do Shreck 3, mas isso não interessa mesmo a ninguém...

3 comentários:

Anônimo disse...

Amigo Fábio,
Assisti semana passada.Que bom que já esteja na doce terra! Já assistiu :VicKYCristina Barcelona? Não perca!
Walnize

Anônimo disse...

Belíssimo filme.

Anônimo disse...

"Romance"
(Nem) Triste, (nem) Isolada

Os dois personagens principais do novo filme de Guel Arraes discutem todo o tempo sobre a herança deixada pelo século XII, com a estória de Tristão e Isolda. E não apenas discutem. Encenam, escrevem peças e filmes e vivem em suas vidas toda a carga dramática que envolve o amor e a paixão de acordo com tal herança. Esse é o mote que dispara a discussão que perpassa todo o filme: em que medida somos ou estamos escravizados a certas experiências do amor e do romantismo que naturalizamos como verdades e qual a possibilidade de, sem recusar essas imagens que nos acompanham durante séculos, produzir outras verdades, outras imagens e experiências do encontro amoroso. A bem da verdade, todos os personagens do filme discutem Tristão e Isolda, com pontos de vista diferentes, mas sempre com grande reverência. E esse é outro ponto de grande magia, pois ao fim de tudo não há quem não esteja imerso numa atmosfera de paixão, expectativa, intensidade, e tudo o mais que aprendemos a codificar como romance.

Então, o percurso de Ana e Afonso, atores que se apaixonam pelo romance Tristão e Isolda e também entre si se vê marcado por estes questionamentos e confrontos. Ambos seguem caminhos que os levam a desencontros e reencontros, mas em todos os momentos está em primeiro plano o amor-paixão e as várias tentativas de redimensiona-lo à luz da urgência em criar outros possíveis e superar impasses morais e éticos. O mais interessante é que o próprio enredo traz para o centro do debate os vários meios artísticos (teatro, televisão e cinema) pelos quais é possível se apropriar do problema colocado pelo romance, com cada diferença de estilo sendo mais uma peça a se encaixar no quebra-cabeça que vai se tornando o encontro de Ana e Afonso, especialmente quando Ana se vê arrebatada por outra paixão. E assim, num genial jogo de espelhos, Ana e Afonso não apenas interpretam os famosos personagens, mas tornam-se também estes mesmos personagens em suas vidas, arte e vida se misturando e se contaminando de maneira irreversível e permanente.

A esta altura o espectador já está irremediavelmente capturado. Apaixonado pelos caminhos que os personagens seguem e apaixonado pela própria paixão que lhe é suscitada por diálogos líricos e bem articulados e tomadas de cena que privilegiam captar em cada rosto e corpo a espontaneidade alegre (ou triste) do amor/ódio brotando e se expandindo.

O desafio que vai ocupar os modernos Tristão e Isolda (sim, de certo modo repetimos Tristão e Isolda, queiramos o não, esta é uma das mensagens do filme) será o de se haver – especialmente Afonso que se põe a escrever um roteiro adaptado para a tv – com as exigências estéticas de um produtor rigoroso e muito voltado para a audiência de seus programas. É aí que o roteiro mostra um grande fôlego, pois os embates entre Afonso e o produtor também fazem parte de uma experiência de paixão e amor: o amor/paixão pela arte, o encontro com o desconhecido que ela impõe, movimento respeitoso com a criação, seja ela no campo artístico estrito, seja na vida comum.

“Romance” opera com delicadeza a desconstrução do mito do amor-sofrimento tratando com bom humor e generosidade os conflitos que surgem ao longo da trama, sem apelar para os piegas e/ou dramáticos. Tem-se mesmo a impressão de que ao fundo somos convocados a dar uma grande risada, como, aliás, podemos fazer na última cena, acompanhando o destino que Ana e Afonso dão para a peça que encenaram no início de (sua) história. Uma boa risada como antídoto contra os males e doenças do amor. Porque não?

As interpretações de Wagner Moura (que extraordinário ator!) e Letícia Sabatella estão excelentes. Mas todo o elenco está ótimo, como por exemplo, José Wilker (o produtor estressado) e Andréia Beltrão (fazendo um tipo ao mesmo tempo hilário e eticamente suspeito). O roteiro, do próprio guel e de Jorge Furtado é delicioso, especialmente nas falas em off, críticas e humorísticas.

“Romance” é especialmente indicado para aqueles que acreditam que o cinema pode encantar e apaixonar e ainda fazer pensar. No caso, um pensamento embalado pelos sonhos e intensidades de Tristão e Isolda...